Hospital pode cobrar por atendimento de emergência mesmo sem contrato assinado.
"Os
ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
reconheceram a um hospital particular de São Paulo o direito de cobrar
por atendimento médico de emergência prestado sem apresentação prévia do
orçamento e sem assinatura do termo de contrato. O caso julgado foi de
uma menina socorrida por policiais militares, após convulsão, e levada
por uma viatura ao hospital.
A menina estava acompanhada pelo
pai. Ele diz que não conhecia São Bernardo do Campo e estava a passeio
na cidade paulista, em maio de 2003, quando a filha teve convulsão.
Procurou socorro no posto de gasolina mais próximo, quando policiais
militares perceberam a situação e levaram os dois ao hospital. Ela foi
atendida no setor de emergência e permaneceu em observação até o dia
seguinte.
Depois de conceder alta médica, o Hospital e
Maternidade Assunção S/A emitiu carta de cobrança pelos serviços
prestados, de quase R$ 5 mil. Questionando a legalidade da exigência, o
pai alega que não assinou contrato algum nem foi informado previamente
de que se tratava de um hospital particular.
O hospital entrou
com ação de cobrança na Justiça. Na primeira instância, o pedido foi
negado. O entendimento foi de que, por envolver relação de consumo,
caberia inversão do ônus da prova no caso, para que o hospital
comprovasse que o pai da menina estava ciente da necessidade de pagar
pelos serviços hospitalares.
Foi considerado ainda que, se o
pai
realmente tivesse se recusado a assinar o termo de responsabilização,
conforme alegado pelo hospital, este deveria ter feito um boletim de
ocorrência na mesma ocasião. Contudo, esse procedimento não foi adotado e
o hospital só apresentou a ação de cobrança mais de dois anos depois
dos acontecimentos.
A sentença afirmou ainda que caberia ao
hospital comprovar que os serviços descritos na ação foram efetivamente
prestados. O hospital interpôs recurso no Tribunal de Justiça de São
Paulo, que manteve a decisão da primeira instância.
Para o
relator do caso no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, a necessidade de
assinatura prévia do contrato e de apresentação do orçamento para o
atendimento médico deixaria o hospital “em posição de indevida
desvantagem”, pois “não havia escolha que não fosse a imediata prestação
de socorro”.
“O caso guarda peculiaridades importantes,
suficientes ao afastamento, para o próprio interesse do consumidor, da
necessidade de prévia elaboração de instrumento contratual e
apresentação de orçamento pelo fornecedor de serviço”, afirmou Salomão. O
ministro acrescentou ainda que a elaboração prévia de orçamento, nas
condições em que se encontrava a paciente, “acarretaria inequívocos
danos à imagem da empresa, visto que seus serviços seriam associados à
mera e abominável mercantilização da saúde”.
No entendimento do
relator, é inequívoca também a existência de acordo implícito entre o
hospital e o responsável pela menina: “O instrumento contratual visa
documentar o negócio jurídico, não sendo adequado, tendo em vista a
singularidade do caso, afirmar não haver contratação apenas por não
existir documentação formalizando o pacto.”
Ônus da prova
Salomão
destacou ainda que cabe apenas ao juiz inverter o ônus da prova. O
relator afirmou que é jurisprudência pacífica do STJ que a regra sobre o
ônus da prova prevista no Código de Processo Civil
– segundo a qual cabe ao autor da ação a demonstração dos fatos
constitutivos do seu direito e ao réu a demonstração dos fatos
extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor – “pode ser
alterada quando a demanda envolve direitos consumeristas.”
Nessas situações, o caso ganha novos contornos e passa a ser excepcionado pelo artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.
“Somente pelo fato de ser o consumidor vulnerável, constituindo tal
circunstância um obstáculo à comprovação dos fatos por ele narrados, e
pelo fornecedor possuir informação e os meios técnicos aptos à produção
da prova, é que se excepciona a distribuição ordinária do ônus”, afirmou
o ministro.
“A inversão o ônus da prova é instrumento para
obtenção do equilíbrio processual entre as partes da relação de consumo,
sendo certo que o instituto não tem por fim causar indevida vantagem, a
ponto de conduzir o consumidor ao enriquecimento sem causa”, concluiu.
Em
decisão unânime, a Quarta Turma anulou a sentença e o acórdão do
tribunal paulista, determinando o retorno do processo para que seja
analisado o pedido do hospital, inclusive com avaliação da necessidade
de produção de provas, “superado o entendimento de que, no caso, não
cabe retribuição pecuniária pelos serviços prestados diante da falta de
orçamento prévio e pactuação documentada”.
Fonte: SITE DO STJ - Superior Tribunal de Justiça: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=103143
Diante da leitura acima, poderemos levar algumas discussões:
1)
Em caso de emergência em que a vida de um indivíduo (não importa idade,
sexo, situação econômica, social, sem tem plano de saúde ou não) está
em jogo, o que é mais importante?
2) No caso de cobrança dos
custos dos serviços de atendimento de emergência de um cidadão que não
apresenta quaisquer condições de pagamento e, tão pouco, plano de saúde,
esta conta deve ser cobrada do Estado, responsável por manter um
sistema de saúde eficiente e capaz de atender a demanda da sociedade.
3)
A omissão de socorro é crime. O hospital, mesmo particular, aquele que
só atende mediante apresentação de cartão de crédito, deve atender
qualquer pessoa que precisar de socorro médico. Afastar o risco de morte
e, depois, encaminhar para o hospital público para internação. O
hospital teve custos? Crie-se uma rotina tal qual um APH ou aquela que
se segue em caso de atendimento de paciente ferido por arma de fogo ou
arma branca.
Muitas vidas seriam poupadas, se não estivessem
agonizando nas filas de emergência dos hospitais e prontos socorros
públicos, porque os hospitais particulares não sabem ainda qual seu
papel e responsabilidade diante de uma vida.
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