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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Mandela e a derrota do apartheid

Mandela e a derrota do apartheid



Tal como Agostinho Neto, Amílcar Cabral e Samora Machel, Nelson Mandela nunca aceitou renegar a luta de libertação de seu país em troca da liberdade

Achille Lollo,
De Roma (Itália) 
Em novembro de 1976, Joe Slovo se encontrou com os primeiros militantes sul-africanos do Congresso Nacional Africano (CNA) que estavam treinando no campo de Funda, a 30 Km de Luanda, capital da República Popular de Angola. Um encontro que, evidentemente, por motivos de segurança não foi veiculado, inclusive porque Slovo estava na lista dos “comunistas que deveriam ser eliminados” – tal como aconteceu em Maputo com sua mulher Ruth First. 
Assim, no campo de treinamento de Funda ficou fortalecida a decisão política do Estado Maior do Umkhonto we Sizwe (braço armado do CNA) em aproveitar a recém- libertação de Angola para começar a treinar, nos moldes de guerrilha organizada, os militantes que fugiriam da África do Sul. 
Naquela reunião, Joe Slovo lembrou aos jovens aspirantes a guerrilheiros – alguns com apenas 16 anos – que eles “estavam em Angola para trilhar o caminho que o camarada Nelson Mandela havia iniciado logo após o massacre de Sharperville em 1960” e que “a palavra de ordem era lutar, lutar, e nunca parar de lutar até acabar com o regime do apartheid”. 
Hoje, somente três quinquagenários daquele batalhão de 115 aspirantes guerrilheiros podem lembrar que cumpriram com a palavra de ordem do Umkhontowe Sizwe (MK)[Lança da Nação, em português] e que  assumiram o compromisso político com  Nelson Mandela para derrotar o apartheid e criar a
nação sul africana. 
Na realidade, esse compromisso sofreu dois desdobramentos. Um de âmbito internacional e outro em nível nacional que condicionou o processo contra o apartheid, delimitando, assim, a construção da nação sul-africana tal como Mandela havia teorizado. 
Sem  dúvida, a sabotagem à central do Sasol, realizada por um grupo especial do MK, onde o regime do apartheid estava testando a tecnologia para poder sobreviverão embargo petrolífero e, a seguir,à grande batalha  em Kuito Canavale, no sul de Angola, onde  os batalhões das FAPLA (Exército angolano) e as unidades do corpo expedicionário cubano derrotaram o exército sul-africano, configuraram- se como o grande golpe inicial que o apartheid sofreu. 
Outro golpe foram as inúmeras manifestações que aconteceram em todo o território da África do Sul, com o objetivo de derrubar o regime, mesmo que naquele momento não  houvesse armas e munições para o fazer. 
De fato, o MK e o PAC haviam organizado muito bem a rebelião em termos políticos nos subúrbios das grandes cidades, mas não conseguiram criar os “territórios libertados”, a partir dos quais promoveriam o cerco militar às cidades. Este era o velho projeto político- militar que o Estado Maior do MK, formado por Nelson Mandela, Joe Slovo e Walter Sisulu, não conseguiu materializar, porque a força dos batalhões de contra- insurgência do exército sul-africano, as unidades de rastreamento do serviço secreto e os grupos especiais da polícia territorial conseguiram criar uma cortina ao redor das fronteiras nacionais e regionais. 
Poucos, muitos poucos conseguiram furar essas linhas de defesa que, porém, se tornaram obsoletas quando a rebelião popular explodiu em todos os perímetros urbanos de uma forma incontrolável, apesar dos mortos, dos feridos e das prisões. 
Lutas e as negociações 
O presidente sul-africano Frederik Willen de Klerk, aos 11 de fevereiro de1990, determinou a libertação de todos os presos políticos  começando a negociar o futuro do país com Nelson Mandela. 
Uma negociação que se iniciou porque a evolução da conjuntura sul-africana e a determinação política dos 9 países da África Austral (Angola, Moçambique, Zimbábue,  Tanzânia, Zâmbia, Botsuana, Lesotho, Suazilândia e Malaui) obrigou os estrategistas do capitalismo mundial a sacrificarem o regime do apartheid para garantir a manutenção na África do Sul de um sistema de industrialização mineira, que é um dos mais ricos do mundo e que, em termos econômicos, tinha a potencialidade de controlar as economias de todos os países da África Subsaariana. 
Uma constatação que Nelson Mandela entendeu e utilizou para construir a nova nação sul-africana, dando à população negra a oportunidade de ser cidadão de verdade dessa nação, além de criar vários instrumentos institucionais capazes de fazer respeitar o conceito de democracia, de liberdade e de igualdade. 
Muitos se perguntam hoje porque o CNA e seu braço armado, o MK, não atacaram o que restava do regime de apartheid. Muitos acham que Mandela e Oliver Tambo desabrocharam quando deviam endurecer no lugar de aceitar as condições fixadas pelo império. 
O problema é que Mandela, bem como Oliver Tambo, sabiam que no seio da população negra havia uma pequena burguesia criada pelo próprio apartheid que queria ser e fazer apenas o que a burguesia branca fazia. 
Eles sabiam também que no CNA e, sobretudo, no seu braço armado o MK(Umkhonto we Sizwe), não havia quadros para substituir  os brancos no exército, na polícia, nos serviços secretos, na aviação e na marinha militar. Além disso, Nelson Mandela sabia, muito bem que em 1991, apesar do fim da Guerra Fria, o mundo capitalista não permitiria que a África do Sul seguisse a mesmo conturbado caminho do Zimbábue ou de Angola ou de Moçambique, vivendo uma interminável guerra civil. 
Nelson Mandela tentou obter o melhor que pôde para o povo negro da  África do Sul. Talvez um  dos erros cometidos na negociação foi de ter deixado aos herdeiros do apartheid demasiada liberdade no controle do poder econômico. Talvez fora concedida demasiada abertura para influenciar as normas e as leis do novo Estado. Talvez.... 
Mas será que todo o povo negro sulafricano, com suas etnias, com a eterna divisão entre Xhosas, Sothos, Zulus, Shangans e Pondo, estava  disposto a construir uma nação sul-africana como o CNA apontou em 1965, quando optou pela luta armada, enquanto os regentes dessas etnias continuaram a querer sobreviver com as migalhas que o sistema do apartheid lhes oferecia? 
Acredito, como muitos também afirmam, que a situação histórica e política da Palestina e o  comportamento da ONU e de todos os países do Ocidente que sempre estiveram a favor de Israel, foi um exemplo que Nelson Mandela não deixou escapar. 
Pois, apesar de ter  recebido todos os prêmios, as medalhas e as condecorações por parte dos antigos inimigos e detratores, ele nunca rejeitou seu passado de comandante do Umkhonto we Sizwe.

Fonte Brasil de Fatos 

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