Jornal: ex-diretor da Siemens relata 'pressão' do governo de SP em concorrência
O
engenheiro Nelson Branco Marchetti, ex-diretor técnico da divisão de
transportes da Siemens, relatou à Polícia Federal ter sofrido "pressão"
de setores do governo de São Paulo, em 2008, para que a multinacional
alemã desistisse de recurso administrativo e de medidas judiciais contra
a escolha da espanhola CAF na licitação de 320 vagões para a Companhia
Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
De
acordo com a reportagem, Marchetti é um dos seis executivos que
trabalharam na Siemens e assinaram acordo de leniência com o Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (CADE) para revelar a ação de carteis
no setor metroferroviário que teriam conquistado licitações milionárias
nos governos do PSDB Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, de 1998
a 2008. A PF investiga suposto esquema de corrupção.
Em depoimento prestado no dia 5 de novembro, o ex-executivo da Siemens afirmou, de acordo com o Estadão,
que "no edital havia a exigência de um capital social integralizado que
a CAF não possuía. Mesmo assim, o então governador do Estado (José
Serra) e seus secretários fizeram de tudo para defender a CAF."
Ainda
de acordo com a reportagem, ele disse que José Luiz Portella,
secretário estadual dos Transportes Metropolitanos na época, "determinou
que os concorrentes tentassem solução de subfornecimento" para demover
a
Siemens do plano de contestar a qualificação da CAF.
O engenheiro
teria afirmado ainda que Portella "sugeriu que a Siemens desistisse dos
recursos e, como forma de se beneficiar de parte da licitação, passasse
a buscar um acordo com a CAF para ser subfornecedora de peças", segundo
o Estadão.
A reportagem esclarece que Marchetti ocupou o
cargo na Siemens entre fevereiro de 2007 e dezembro de 2008. "Era
encarregado de manter contato com agentes públicos. Contatos frequentes
com Portella e seu vice, João Paulo de Jesus Lopes. Da CPTM, contatos
com seu presidente, Sérgio Avelleda, que depois se tornou presidente do
Metrô, bem como com diretores da CPTM." O texto prossegue afirmando que
ele sucedeu a Everton Rheinhemer, a quem é atribuída a autoria de carta
anônima, de 2008, ao ombudsman da Siemens na Alemanha, na qual relata
condutas anticompetitivas de multinacionais no Brasil e pagamento de
propinas nos setores de energia e dos transportes públicos.
Segundo o Estadão,
no depoimento de seis páginas de Marchetti, ele disse que houve
"tentativa de formação de cartel com a Alstom". Revelou combinações de
preços, ajustes prévios, reuniões reservadas, além de grande empenho de
autoridades do governo paulista, na ocasião, em fechar contrato com a
CAF. Alega ter explicado a Portella que a Siemens tinha condições de
prosseguir sozinha no projeto, não tinha motivos para desistir da
licitação. "A CAF foi qualificada e a Siemens apresentou recurso
administrativo, que foi negado."
A reportagem prossegue relatando
que a Siemens foi à Justiça, com mandado de segurança. Pediu suspensão
da licitação e revogação da qualificação da CAF. A liminar foi concedida
em primeira instância judicial - depois caiu. "Aumentou a pressão da
CPTM, através de Avelleda, e da Secretaria dos Transportes para que a
Siemens desistisse e deixasse o contrato ser firmado rapidamente com a
CAF."
Ainda segundo o texto do Estadão, Marchetti relatou
encontro com Serra e Portella, "em meio a esse período de pressão",
durante evento em Amsterdã da International Union of Railways (UIC).
"Aproveitei para dizer que entendia que minha empresa estava certa e que
não tinha intenção de desistir de recorrer." Em resposta, diz, "foi
informado por Serra que, se a CAF fosse desqualificada em razão do
mandado de segurança impetrado pela Siemens, o governo iria cancelar a
licitação e não simplesmente adjudicar o objeto ao segundo colocado,
porque a diferença de preços entre as propostas do primeiro e do segundo
colocados era grande e o governo não concordava em pagar o valor mais
alto da proposta oferecida pela Siemens".
Segundo Marchetti, o
secretário, seu vice e Avelleda alegavam "objetivo de que não houvesse
atrasos no fornecimento dos trens, pois o projeto era de relevante
interesse social". Ele disse que era procurado diretamente "pelo sr.
Portella (...) e pelo sr. João Paulo". "A argumentação usada era sempre o
aspecto social e a importância de a licitação ser concluída logo." De
acordo com a reportagem, as reuniões ocorriam na Secretaria dos
Transportes. Avelleda "também fazia contatos, pressionando para a
licitação se concluir logo e sem entraves".
A PF o indagou sobre
e-mail de 27 de setembro de 2007, que dizia. "Como resultado, o Governo
de São Paulo gostaria de ver a Siemens sendo contemplada com pelo menos
1/3 do pacote (cerca de 128 carros) em parceria com a equipe acima que,
por sinal, já foi informada pelo Governo de São Paulo." Ele disse.
"Realmente teve uma reunião com Portella, na Rua Boa Vista, o Governo
apresentou o desejo de que a Siemens participasse da licitação", encerra
o texto.
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