MP-SP apura pagamento de indenizações a integrantes do PCC em obra do Rodoanel
Em São Paulo
- Rivaldo Gomes
O Ministério Público Estadual (MPE) investiga a denúncia de que a
empresa Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa), do governo paulista,
pagou indenizações a criminosos ligados ao Primeiro Comando da Capital
(PCC) no programa de reassentamento das obras do trecho sul do Rodoanel e
do prolongamento da avenida Jacu-Pêssego, na Grande São Paulo. Ambas foram entregues em 2010, nos governos José Serra e Alberto Goldman (PSDB), ao custo de R$ 7 bilhões.
Os promotores já identificaram pelo menos dez pessoas indenizadas pela
Dersa na cidade de Mauá e na zona leste de São Paulo que têm passagens
pela polícia por roubo, furto e tráfico de drogas. A investigação teve
origem nos depoimentos de uma ex-funcionária da Dersa chamada Mércia
Ferreira Gomes, que trabalhava à época em um consórcio contratado para
executar o programa de reassentamento e fechou acordo de delação
premiada com o MPE. As indenizações custaram mais de R$ 100 milhões e
beneficiaram cerca de 40 mil pessoas.
Segundo Mércia, no
processo do Rodoanel, "a bandidagem que domina a área começou a fazer
ameaças e, para possibilitar que o pessoal da empresa contratada pela
Dersa fizesse seus trabalhos, se deveria pagar algum valor para a
criminalidade". Ainda de acordo ela, se o valor não fosse pago,
funcionários sofreriam "represálias", como ficar trancados na sala do
plantão social. "Diante de tanta solicitação nesse sentido, o dinheiro
acabou", disse.
A ex-funcionária relatou que os pagamentos eram
feitos em dinheiro e
"a maioria dos bandidos recebia valores na Dersa e
comparecia armada". Segundo Mércia, muitos pegavam o dinheiro e saíam
sem assinar nenhum recibo. Os pagamentos ocorreram entre agosto e
outubro de 2009 e seriam indicados por uma pessoa chamada Hamilton
Clemente Alves, que, segundo testemunhas, se apresentava como assessor
do ex-deputado estadual Adriano Diogo (PT), que nega o fato.
À
época, Alves participou de audiência pública sobre o caso na Assembleia
Legislativa como presidente do Movimento em Defesa das Famílias do
Traçado Jacu-Pêssego. Entre 2013 e 2015, ele trabalhou como assessor do
ex-vereador Alessandro Guedes (PT) e foi exonerado há dois meses de
cargo na Subprefeitura de Cidade Tiradentes na gestão Fernando Haddad
(PT). Alves também está sob investigação e deve ser chamado a depor pela
Promotoria.
De acordo com Mércia, as indenizações variavam de
R$ 1,6 mil a R$ 250 mil e chegaram a ser pagas até três vezes a uma
mesma pessoa que invadiu diferentes áreas que seriam desapropriadas.
Segundo ela, os pagamentos foram autorizados pelo ex-diretor de
Engenharia da Dersa Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, que também
nega o fato. As informações foram prestadas ao MPE em abril de 2015 e
ratificadas em recente delação premida, ainda não homologada pela
Justiça.
"Um dos indícios que temos é que o dinheiro era
encaminhado para pessoas ligadas ao crime organizado. As pessoas que
trabalhavam e foram indicadas por Mércia, em depoimento, serão chamadas
para prestar esclarecimentos", disse o promotor Cássio Conserino.
Também em depoimento ao MPE em 2015, o ex-chefe do Departamento de
Assentamento da Dersa Geraldo Casas Vilela disse que a empresa recebeu
uma carta atribuída ao PCC com ameaças, caso as remoções das famílias
prosseguissem. Segundo ele, "diversas foram as dificuldades encontradas
nesses processos de pagamento, sobretudo porque as áreas geralmente eram
dominadas por pessoas ligadas a atividades criminosas".
Desvios
Mércia é investigada por ter incluído ilegalmente 16 pessoas ligadas a
ela no cadastro de reassentamento das obras e desviado R$ 813 mil de
indenizações. Ao MPE, no dia 9 deste mês, ela disse que fez isso a mando
de Vilela e de Paulo Preto, para pagar pessoas que moravam na favela e
não tinham documentos para o cadastro. Ambos negam as acusações. Segundo
Mércia, nenhum parente seu ficou com o dinheiro.
Na semana
passada, os três e uma filha de Paulo Preto foram denunciados à Justiça
por incluir ilegalmente o nome de seis pessoas ligadas ao ex-diretor na
lista de indenizados com apartamentos da Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano (CDHU), no valor de R$ 374 mil. Na lista estão
babás, empregadas e funcionário que trabalhava para a família dele, que
nega irregularidades.
Outro lado
Responsável pela construção do trecho sul do Rodoanel e do prolongamento da avenida Jacu-Pêssego, a Dersa informou, em nota, que "apurou e forneceu" ao Ministério Público Estadual (MPE) "um vasto conjunto de provas
que embasou a denúncia já apresentada pela Promotoria de Justiça
Criminal" contra o ex-diretor da empresa Paulo Vieira de Souza, uma
filha dele, e outros dois ex-funcionários por pagamentos indevidos de
indenização.
"O rigoroso trabalho de auditoria interna tem
possibilitado que o Ministério Público identifique, com precisão, os
beneficiados pela fraude e responsáveis pela aprovação dos pagamentos
indevidos realizados em 2009 e 2010. Nenhum dos funcionários apontados
pelo MP integra mais o quadro de funcionários da empresa", informou a
Dersa.
Uma auditoria interna ainda analisa se houve mais
irregularidades em cerca de 3.000 processos envolvendo o reassentamento
de famílias nas duas obras, concluídas em 2010, incluindo pessoas
ligadas ao crime organizado. "Desde 2011, a Dersa alterou o procedimento
de cadastro de beneficiados e pagamento das indenizações, com o
objetivo de evitar fraudes no seu programa de reassentamento", completa a
estatal.
As informações são do jornal "O Estado de S. Paulo".
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