Política
Oposição
Do “Fora FHC” ao “Fora Dilma”
por Marcos Coimbra
As semelhanças entre os apelos de 1999 e as manifestações recentes
O governo está mudo, incapaz de formular e
transmitir sua narrativa dos acontecimentos no País, de como chegamos
aonde estamos e para onde vamos. Não tem um discurso a respeito do que
faz, do porquê e o que almeja. Limita-se a reagir de forma espasmódica e
pouco criativa às pressões recebidas.
Pede a todos, ricos e pobres,
simpatizantes e adversários, concordância com a necessidade de um
“ajuste”. Parece no fundo querer um cheque em branco, pois não explica
aos cidadãos os motivos que o exigem, não esclarece quais sacrifícios
serão necessários e não fixa um horizonte.
Da oposição
raramente se ouve algo que preste. Ela não expõe ideia, projeto ou
proposta ao debate nacional. Seus líderes, embora cheios de cabelos
brancos, agem tal qual meninos radicais. Fazem o mesmo que criticavam em
seus velhos inimigos, os petistas contra quem brigaram em seus tempos
de governo.
A gratuita sugestão de Fernando Henrique Cardoso a Dilma Rousseff, a renúncia, é um exemplo perfeito dessa irresponsabilidade. A menos que se trate de uma reles vingança de quem teve de ouvir apelo idêntico.
Em 1999, em meio à crise instaurada no
início de seu segundo mandato, o tucano ouviu do petista Tarso Genro a
sugestão de deixar a Presidência e convocar novas eleições. Genro
baseava-se na “fraude eleitoral” cometida por FHC durante a campanha,
quando prometera fazer o inverso do que fazia, e no fato de ele ter
perdido condições morais de governar, depois do “escândalo da
privatização”.
Enquanto os principais nomes
da oposição se apequenam, os pequenos ficam menores. Ora nos brindam
com declarações de um reacionarismo truculento, ora posam de ingênuos e
fingem espanto diante das revelações a respeito da maneira como se
financia, desde sempre, a política no Brasil. Terão se esquecido de que a
eleição de praticamente todos foi custeada por meio do mesmo mecanismo?
O que se ouve e se lê na mídia é quase sempre de chorar.
Às vezes por ignorância, na maioria dos casos por opção ideológica,
oferece-se à opinião pública uma interpretação equivocada de nossa vida
política. Em regra, a função dessa “leitura da realidade” é legitimar o
discurso da oposição. Isso ficou claro no tratamento dado pela
dobradinha mídia/oposição às manifestações antigoverno.
Centraram a discussão na dimensão quantitativa:
relevante era o número de participantes. A oposição fixou-se na
quantidade tanto quanto os meios de comunicação. Como se os
manifestantes diferissem daqueles que permaneceram em casa apenas por
seu ativismo e os brasileiros fossem uma massa homogênea, o que faria de
quem protestava a amostra perfeita de todos.
Diante dessa hipótese inverossímil, a
reação do governo e
seus simpatizantes foi negá-la. À argumentação das quantidades, proposta
pela oposição e pela mídia, fez-se a contraposição da sociologia dos
manifestantes. As mesmas fotos que atestariam o “tamanho” dos eventos
evidenciariam sua composição atípica. Ao contrário de expressar o
Brasil, seriam exclusivas da classe média branca das metrópoles.
As duas teses são verdadeiras: os protestos foram
“grandes” e de fato seus participantes não eram sociologicamente
representativos do conjunto do País. Mas nenhuma delas centra-se no
aspecto mais significativo do fenômeno.
Pela segunda vez temos um presidente no início do segundo
mandato a enfrentar graves problemas. Pela segunda vez a popularidade
presidencial despenca e fica em idênticos 8% de avaliação positiva em
agosto do primeiro ano pós-reeleição. Antes de Dilma Rousseff, também
Fernando Henrique ouviu “apelos” para renunciar e viu seus oponentes
moverem-se para conseguir seu impeachment.
Pela segunda vez, estimulada por clima
parecido, a oposição convoca protestos populares. O “Fora FHC” de 1999
chegou a colocar cerca de 200 mil manifestantes nas ruas de Brasília e,
muito provavelmente, seus organizadores teriam enchido a Avenida
Paulista se assim o desejassem.
Qual a diferença em relação a hoje? Em 1999, o establishment
foi hábil ao pespegar a etiqueta de “coisa de petista” no “Fora FHC”, o
que impediu que ele fosse interpretado como uma manifestação do
conjunto da sociedade. Agora, os mesmos personagens propalam a tese
inversa e querem tornar “dos brasileiros” um movimento específico de uma
porção, não majoritária, do País.
Desde o domingo 16 veio
a público uma única pesquisa com manifestantes que continha a pergunta
fundamental, a respeito do voto em 2014. Foi de responsabilidade da
Universidade Federal de Minas Gerais e realizada em Belo Horizonte.
Entre os entrevistados nas
ruas da cidade, 79% votaram em Aécio
Neves e 11% anularam ou deixaram em branco o voto. A se considerar os
dados de pesquisas semelhantes conduzidas ao longo do primeiro semestre,
o quadro em outros locais não terá sido muito diferente.
A discussão relevante não é se os
manifestantes foram muitos ou poucos. Ou se foram típicos ou não da
sociedade. O mais importante: estavam nas ruas, quase exclusivamente,
eleitores do PSDB.
Problema? Obviamente não, pois esses cidadãos têm todo
direito de se mostrar tristes com o resultado da última eleição. O que
não justifica esconder da opinião pública o fato de serem eles a ocupar
as ruas.
No modo como a dupla mídia/oposição
apresentou e discutiu as manifestações ficou escondida sua
característica mais importante. E o governo, em sua mudez, não teve
argumentos para rebater a fábula. O Fora FHC foi “coisa de petista”?
Certamente. Falta é dar nome às atuais manifestações. Quem sabe não
poderiam ser consideradas um “tucanaço”?
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