PSDB blindado pela mídia
- Estados do Brasil:
Para especialistas, cobertura da imprensa em relação
ao caso de corrupção no Metrô e na CPTM mostra partidarismo dos veículos
de comunicação
O
governo tucano de São Paulo fica cada vez mais enredado no caso de
cartel das licitações do Metrô e da Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos (CPTM). Documentos apresentados pela Siemens ao Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) comprovariam o pagamento de
propinas a autoridades envolvidas no esquema que lesou os cofres
públicos paulistas em pelo menos R$ 425 milhões.
As
denúncias de cartel são investigadas pela Operação Linha Cruzada,
realizada pelo Cade em conjunto com a Polícia Federal. As suspeitas
apontam para o envolvimento de 13 empresas na formação de cartel em seis
licitações para aquisição de trens, manutenção e construção de linhas
ferroviárias e de Metrô em São Paulo e no Distrito Federal.
As
fraudes, ocorridas entre 1998 e 2007, começaram a ser reveladas pela
Siemens em julho, depois de um acordo de delação premiada para garantir
imunidade para a companhia e seus executivos.
Segundo informações divulgadas pela Folha de S.Paulo,
o Cade analisa diários da Siemens que contêm registros sobre as
reuniões entre representantes da transnacional alemã e o governo de São
Paulo. De acordo com os documentos, o cartel, apelidado de a “grande
solução”, era o desfecho preferido pela Secretaria de Transportes por
garantir “tranquilidade na concorrência”.
O
cartel em São Paulo teria sido formado em 2000, no governo de Mário
Covas (PSDB), para a construção da linha 5 do Metrô, e continuado
durante as gestões de Geraldo Alckmin (2001-2006) e também no primeiro
ano do governo de José Serra (2007). A ideia era formar um consórcio
único para vencer licitações e depois subcontratar as empresas
perdedoras, o que acabou acontecendo.
Imprensa
Apesar
da magnitude, o esquema de corrupção começou a ser noticiado de forma
tímida na imprensa corporativa. Em sua edição de 14 de julho, a Folha de S.Paulo
trouxe o assunto em uma manchete e repercutiu as denúncias no dia
seguinte. O jornal só deu visibilidade ao caso novamente em 2 de agosto,
com uma matéria sobre os diários da Siemens. Seu concorrente, o Estado de S.Paulo, não aproveitou o hiato da Folha para dar repercussão ao caso – publicou apenas matérias curtas e sem destaque.
Nos canais de TV, o silêncio é ainda maior. As emissoras repercutiram pouco o caso. O Jornal Nacional,
da TV Globo, só trouxe o assunto à tona em 2 de agosto, depois de as
denúncias terem sido abordadas em jornais, revistas e, principalmente,
nas redes sociais.
Blindagem
A
postura dos meios de comunicação corporativos, porém, não surpreende os
especialistas. Para o professor da Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo (ECA-USP) Laurindo Leal Filho, a cobertura
atual da mídia se assemelha ao que ocorreu durante as denúncias sobre o
chamado “Mensalão Mineiro”, envolvendo lideranças do PSDB naquele
estado.
“A cobertura é bastante diferenciada
quando é em relação ao PSDB. Há uma preocupação em não expor o partido,
seus dirigentes e os governantes ligados ao partido envolvidos no caso”,
afirma. Cobertura oposta ao que ocorreu quando o alvo das denúncias
eram lideranças do PT. O professor lembra que em 2005, durante a CPI do
Mensalão, o assunto foi destaque nos noticiários durante meses. A
atenção foi tanta que as notícias pipocavam até mesmo fora dos
telejornais, durante a grade normal de programações da TV Globo.
Outra
peculiaridade é a ênfase no nome das empresas. Em outros casos de
corrupção, explica Filho, é comum que os nomes das companhias sejam
preservados, deixando o peso sobre os “corrompidos”. Agora, porém, os
governos do PSDB são citados – quando o são – de forma discreta nas
matérias.
“Isso prova mais uma vez que essa mídia
tem um lado bastante definido. E quando esse lado está sob algum tipo
de ataque, ela faz todo o possível para minimizar o fato”, analisa.
O
presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé,
Altamiro Borges, critica a “blindagem” dos veículos em relação às
denúncias de corrupção. Para ele, o caso ilustra a seletividade da
imprensa, que trabalha as informações de acordo com seus interesses.
“O
que não interessa para a mídia ela esconde e omite. O que interessa ela
dá destaque, realça, dá manchete, faz várias matérias. O que a gente
está vendo nesse caso é a confirmação da tese do professor Perseu
Abramo”, afirma, referindo-se aos estudos do jornalista Perseu Abramo
(1929-1996) sobre a mídia. Em seu livro Padrões de Manipulação na Grande
Imprensa, Abramo defendeu que a manipulação não consiste em apresentar
inverdades, e sim em criar realidades distorcidas a respeitos dos fatos.
A
própria nomenclatura escolhida para os “mensalões”, de acordo com
Altamiro Borges, é um exemplo do tratamento diferenciado. “O caso do
chamado Mensalão envolvendo o [José] Dirceu e o [José] Genoino é o
Mensalão do PT; o Mensalão envolvendo Eduardo Azeredo e Aécio Neves em
Minas não é o Mensalão Tucano, é o Mensalão Mineiro”, observa.
Se
a cobertura como um todo gera críticas, as mais fortes vão para os
canais de televisão. “É uma obrigação, principalmente nas concessões
públicas, o respeito mínimo à diversidade e à pluralidade informativas,
mas isso não existe na mídia brasileira”, dispara o presidente do Centro
de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Protesto
Se
na imprensa corporativa as denúncias de formação de cartel não ganham
destaque, nas redes sociais o assunto é debatido há várias semanas. O
caso vem sendo lembrado em diferentes manifestações em São Paulo e tem
contribuído para engrossar os pedidos de impeachment contra o governador
Geraldo Alckmin.
Um grupo de cerca de 20
manifestantes chegou a acampar em frente à sede do governo pedindo,
dentre outras reivindicações, a abertura de uma CPI para apurar as
irregularidades.
Para o jurista Fábio Konder
Comparatto, as denúncias podem motivar a abertura de uma ação penal.
“Parece um caso manifesto de corrupção. É preciso abrir inquérito (se é
que já não foi aberto) e aguardar que o Ministério Público inicie a
devida ação penal”, afirma.
Para 14 de agosto,
está prevista nova manifestação contra o desvio de recursos no Metrô e
na CPTM, convocada pelo Movimento Passe Livre (MPL), Sindicato dos
Metroviários e movimentos sem teto.
Para Altamiro
Borges, as mobilizações nas ruas podem forçar a mídia corporativa a dar
mais relevância às denúncias. “Se o caso do propinoduto tucano ganhar
as ruas e se outros jornais ou revistas de menor tiragem forem dando
[notícias relacionadas], isso vai forçando os ‘caras’ [veículos] a se
pronunciarem”, diz.
Laurindo Leal Filho, no
entanto, é mais cético. Segundo o professor, o elo entre a imprensa com o
PSDB é tão forte que nem mesmo as mobilizações farão muita diferença
para as próximas coberturas. “O compromisso deles [veículos] com o PSDB é
tão grande que eles vão resistir ao máximo”, avalia. (Colaborou Marcio Zonta)
Mais sobre o assunto:
Foto: Daniel Guimarães/Governo SP
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/17708
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