Filósofo debate a questão da importação de profissionais após os últimos governos não terem feito o dever de casa
Quando li o professor Delfim Neto na imprensa dizendo que
o Brasil não podia perder a chance de importar mão de obra barata,
produzida pela crise europeia e americana, eu já havia escrito que este
seria forçosamente o caminho da presidente Dilma. Não deu ainda um ano
da emissão da minha previsão e do conselho de Delfim e a importação já
está aí na praça. O governo está chamando médicos do exterior e agora, a
pedido de prefeitos, a presidente Dilma anunciou que está estudando a
possibilidade de importar engenheiros.
Delfim Neto estudou economia – dá sugestões e conselhos. Eu estudei filosofia – ponho moscas em sopas.
Protesto de médicos realizado no Rio de Janeiro
De 1993 para os dias de hoje o brasileiro
dobrou sua renda, foi de 2.500 para 5.500 dólares. Passou a consumir
mais. As cidades brasileiras, todas elas, nos últimos vinte anos
ganharam mais “ruas de comércio” e shoppings. Nosso país está entupido
de drogarias, restaurantes, bares, academias de ginástica, lojas de
bijuterias, pequenos e grandes supermercados, postos de gasolina e gente
na Internet. O ciclo dos governos FHC-Lula-Dilma nos deu isso. Mas, ao
mesmo tempo, a mão de obra qualificada apropriada para todos esses
serviços não tem dado as caras. Por quê? Simples: o Brasil não tem
investido na qualidade da educação geral pública, o que possibilitaria
ao mercado ter em mãos um jovem treinável, uma vez em um emprego
determinado. Desse modo, tudo indica que a saída para esse impasse, a
essa altura do campeonato, é a importação de mão de obra. Perdemos
tempo, não fizemos o dever de casa, e agora vamos agir pelo modo que
restou.
O trabalhador brasileiro tem necessitado de muitos anos
de escola para conseguir se mostrar apto a um posterior treinamento, e
isso mesmo em serviços que formalmente estão aquém do nível do seu
diploma. Descrevo o panorama.
A menina que cursou o ensino médio não consegue fazer o
troco no balcão da padaria em que trabalha – nem mesmo com a máquina de
calcular! Desse modo, o empresário se vê pressionado a requisitar para
esse tipo de trabalho alguém com um diploma de nível superior. O bom
profissional do ensino superior, ou seja, aquele que não vai ficar no
balcão da padaria, e que realmente vai exercer a profissão para a qual
fez a faculdade, livra-se do concorrente, este sim, então, irá ocupar o
lugar da garota formada no ensino médio. O resultado disso é um só: a
mão de obra em lugares mais distantes e mais pobres começa a faltar ou
encarecer. Em princípio é para tais lugares que o governo quer trazer o
trabalhador estrangeiro.
Nada de novo no front. Por outras vezes em nossa
história, precisamos de mão de obra e ao invés de nos voltarmos para a
nossa educação, optamos pela saída de última hora, ou seja, a importação
de trabalhadores. Essa solução do problema tem um preço: quando, ao
final da escravidão, trouxemos o imigrante, abandonamos o negro às
favelas. Depois, em outras épocas de desenvolvimento real ou fictício,
também fizemos a mesma coisa e, é claro, criamos aí o favelado pobre
branco. Qual será o preço social desta vez?
Os que tendem a só ver glórias nesse ciclo FHC-Lula-Dilma
não querem colocar essa pergunta, se recusam em entendê-la, alguns até
fingem que não é uma pergunta legítima. Mas é.
Paulo Ghiraldelli Jr, 55, filósofo, escritor, cartunista e professor da UFRJ
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