Impostometro

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Falsas vozes podem prejudicar atos autênticos

Falsas vozes podem prejudicar atos autênticos

Jovens que emergiram dos protestos causam polêmica

Representantes de movimentos sociais denunciam que falsas vozes podem prejudicar atos autênticos

A “força das ruas” levou jovens ativistas ao gabinete da presidente Dilma Rousseff e de seus ministros, numa conquista sem igual de credibilidade e respeito da juventude. Mas, assim como surgiram os vândalos em meio aos atos pacíficos, figuras isoladas tentaram penetrar nesse processo legítimo de comunicação e acordos entre movimentos juvenis e Congresso Nacional, denominando-se líderes únicos de atos caracterizados por sua multiplicidade. O combate à corrupção foi a bandeira dos supostos líderes. O caso mais recente é do técnico de segurança do trabalho, Maycon Freitas, da União Contra a Corrupção (UCC), uma rede social criada no dia 11 de maio e que é alvo de desconfiança das organizações oficiais.
Freitas, que assumiu na imprensa a posição de “Líder das Massas”, admite ter votado no Lula para presidente nas eleições de 2002, mas depois se desiludiu com o PT, “porque abandonou a bandeira da ética, que era deles”; não é a favor dos partidos políticos, “pois são grupos fechados que só servem para os políticos formarem conluios bem longe da vontade do povo” e justifica a sua participação nas manifestações por ele e seus amigos “estarem cansados de tantas histórias de corrupção”. Freitas diz que seu grupo “não é de direita, de esquerda e nem de centro”.
Representantes de movimentos jovens se reuniram na semana passada com a presidente Dilma Rousseff
Representantes de movimentos jovens se reuniram na semana passada com a presidente Dilma Rousseff
EQUÍVOCO
Para o sociólogo e cientista político da UFRJ, Paulo Baía, é impossível eleger um único líder em protestos múltiplos e de pautas que podem representar linhas de pensamento contrárias, como o aborto e a legalização da maconha, por exemplo.
- As atuais manifestações têm um diferencial que é o ponto chave de todo o processo, elas têm centenas de líderes espalhados por todo o Brasil, que estão defendendo temas específicos e muitos deles antagônicos. Considerando esse fato, é impossível nomear um líder único para representar as multidões que estão nas ruas, isso é um absurdo. O que podemos observar é que quando um jovem faz um pronunciamento, os demais se identificam com o sentimento dele, mas isso é algo diferente de liderança, não representa que haja ali uma unidade. Considerar o Maycon líder dos manifestos é um equívoco e, com certeza, isso vai provocar uma rejeição à sua imagem por parte das massas, avalia Baía.
Segundo o sociólogo, o erro daqueles que estão tentando criar líderes momentâneos para transmitir mensagens em meio aos protestos, reside na incompreensão dos reais motivos dos atos e ainda estão amparados em parâmetros ultrapassados para analisar os fatos recentes. “Até nós, professores universitários, os governantes e a própria população ainda estamos procurando entender o que está acontecendo no Brasil, é algo muito novo, transformador. Inclusive, os parlamentares estão apreensivos com essa situação, pois não conseguem identificar um líder, uma unidade, mas estão aprendendo a conviver e lidar com a multiplicidade de reivindicações e classes protestantes”, completou Baía.
DESCONHECIDO
Presidente do Conselho Nacional da Juventude, Alessandro Melchior participou das reuniões com a presidente Dilma Rousseff, em Brasília, e com o ex-presidente Lula, em São Paulo e afirma não conhecer Maycon Freitas, nem dos encontros oficiais e nem das manifestações.
- Nunca ouvi falar de Maycon Freitas. Além do MPL (Movimento Passe Livre), as organizações que fazem parte do Conselho Nacional de Juventude estavam desde o início das manifestações em São Paulo, isso está nas notas e manifestos que foram lançados no início dos atos, tudo disponível na rede. Se você perguntar para qualquer pessoa ninguém conhece esse cara. Essa turma precisava sair do Higienópolis e do Leblon, andar de ônibus, conhecer o Capão Redondo em São Paulo, a Maré e o Alemão, no Rio. Ler um pouco, inclusive. Sempre digo que instrução e realidade não fazem mal a ninguém, revelou Melchior.
Com relação ao perfil da UCC na internet, Melchior considerou como “mais uma dessas redes virtuais de jovens brancos de classe média-alta, com excesso de tempo livre e com tendências neofascistas”. Melchior chegou a essa conclusão através dos discursos da UCC, que segundo ele são “superficiais e as denúncias são sensacionalistas, sobre golpe comunista no Brasil”.
- É toda a reprodução do discurso da direita hoje. Quando ele critica o Renan Calheiros, por exemplo, ele representa a instituição, a própria existência do Senado. Antes dele tivemos o Sarney, o ACM, o Jader Barbalho. Personificar o problema é sinônimo de falta de capacidade de analisar o contexto. O bicameralismo, a lógica de uma câmara alta, dos lordes, isso é anacrônico. Portanto, a crítica ao Renan é uma crítica sensacionalista, que não leva a lugar nenhum, avalia o presidente do conselho.
Buscando as motivações que desencadearam os protestos, Melchior lembra que eles surgiram em defesa da melhoria do transporte público e pela redução dos preços das passagens. Mais tarde, caminharam para a ampliação de direitos sociais, ainda incluindo uma crítica do transporte público como um direito e não como serviço, como acontece hoje. Evoluindo as discussões sobre os atos, somente nesse momento foi incluída a pauta de combate à corrupção.
- E essa pauta do combate à corrupção foi incorporada de forma torta, porque dizer que é contra corrupção todo mundo diz. O problema é o foco, a proposta. Aí a capacidade de incidência reduz, pois o senso comum impera. No Brasil, se criou paulatinamente um discurso de vincular a corrupção ao público e à política, ignorando os bastidores, as empresas, o mercado. Quase todos os casos de corrupção no país têm uma relação direta com setores empresariais que financiam as campanhas. Acabar com o investimento privado é o primeiro passo, sem isso, fica no blá blá blád e militante coxinha, ponderou Melchior.
CONTRADIÇÃO
Repercutindo as declarações de Maycon na imprensa, Alessandro Melchior acredita que Freitas se contradiz nas suas colocações, pois ele cita a criação de hospitais, como se o problema fosse somente de equipamentos públicos e redução de impostos.
- Quem vai financiar isso com a redução dos impostos? Não há embasamento concreto. O Brasil possui menos médicos por habitantes que a Argentina. Isso é problema concreto que se resolve a médio prazo, com mais vagas de medicina nas universidades e, agora, com a importação de profissionais estrangeiros, como já estamos fazendo em várias áreas. O próprio PSDB e o Serra eram favoráveis quando estavam no Ministério da Saúde. Agora, são contra. Na reforma política, a página da UCC fala que o plebiscito é golpe. Eles atacam o Congresso, desqualificando a política e defendem que esse mesmo Congresso faça a reforma política e o povo assine embaixo por referendo depois? É um problema de organização do discurso e capacidade cognitiva, é basicamente o que fica explícito nessa entrevista, analise o presidente da CNJ.

Nenhum comentário:

Postar um comentário