Política
15 de março
MBL, o movimento "democrático" que hostiliza a imprensa
Grupo pró-impeachment joga multidão contra jornalistas de CartaCapital que trabalhavam na cobertura dos atos anti-Dilma
por José Antonio Lima
Em meio a uma manifestação integrada por pessoas sem pudor de pedir a
volta da ditadura, a hostilidade à imprensa partiu justamente dos ditos
liberais anti-Dilma. Foi com essa situação que a reportagem de CartaCapital se deparou neste domingo 15 de março ao ser recebida no carro de som do Movimento Brasil Livre (MBL) na avenida Paulista, em São Paulo.
Reprodução
Depois de reunir depoimentos mostrando a crescente pluralidade da indignação com o governo petista,
a reportagem se dirigiu ao veículo onde estavam os dirigentes do MBL,
na frente do Masp, para colher sua versão sobre os atos. A recepção foi
amistosa, e transpareceu o receio de alguns integrantes do grupo de se
pronunciarem no lugar dos líderes, Kim Kataguiri, de 19 anos, e Renan
Ferreira Santos, de 31. No carro de som, o primeiro recebeu a reportagem
para uma entrevista que prosseguia normalmente até alguns de seus
colegas no MBL, conduzidos por Tom Martins, começarem a incitar as
dezenas de milhares de pessoas contra os jornalistas. Gritos de
"sujos", "corruptos", "mentirosos", entre outros, partiam de uma
multidão ensandecida, que impediu a saída da equipe mesmo diante da
tentativa de "escolta" montada pelo MBL.
Martins e seus companheiros estavam ali claramente tomados pelo
sentimento de rejeição ao PT, o principal denominador comum das massas
presentes nas ruas no domingo 15. Devidamente insuflada, como vem sendo
nos últimos anos por políticos e jornalistas, entre outros, essa
rejeição se transforma em ódio ao Partido dos Trabalhadores e a qualquer
bandeira, pessoa ou instituição percebida, corretamente ou não, como
ligada ao partido.
No caso de CartaCapital, esse processo
ocorre por meio de uma dupla campanha, que mistura difamação e uma
tentativa de tornar a publicação invisível. A primeira se realiza quando
a transparência de ter um candidato, e comunicar isso ao leitor, é
tratada como alinhamento incondicional. A segunda se confirma a cada vez
que um editor da grande imprensa corta citações a CartaCapital
em reportagens ou mesmo quando alerta seus funcionários a respeito de
solidariedade excessiva nas redes sociais para com colegas da revista
vítimas de arbitrariedade policial.
No caso dos indivíduos, a situação é mais grave. O sujeito
enxergado como "petista", seja por rejeitar o PSDB, por ter votado 13
eventualmente ou por apenas trabalhar em uma publicação com
candidato declarado, é tratado como comprado ou cooptado e, portanto,
ilegítimo. Em um estágio mais grave, o "petista" é desumanizado,
transformado em inimigo, passível de ser hostilizado e empurrado
enquanto trabalha. Deve ser jogado aos leões em uma situação que, sem
ajuda, poderia ter um desfecho bem mais grave.
Esse processo é particularmente perturbador pois ocorre de
forma concomitante às críticas, corretíssimas aliás, feitas ao
vocabulário por vezes belicoso e sectário do ex-presidente Lula e do PT e
também ao uso do execrável termo "PIG" por parte de
certos jornalistas.
Enquanto critica-se o PT, adota-se como prática de retórica um dos mais
torpes métodos de alguns membros do partido.
Aos poucos, o país em que "política não se discute" se torna o
país em que a discussão política é feita por métodos virulentos e
antidemocráticos, uma tendência simbolizada por pedidos de divisão
territorial e cancelamento do sufrágio universal, como ocorreu nas
últimas eleições. Nos textos de determinados jornalistas, nas falas de
alguns ativistas e nas postagens de milhões de pessoas em redes sociais
está o caldo cultural da violência política que espreita o País, cada
vez mais claramente.
Quanto ao MBL, a postura hostil não é exatamente uma surpresa. Em 6 de março, Kim Kataguiri postou um vídeo na página do movimento gravado, de madrugada, em frente à redação de CartaCapital. Foi
uma óbvia forma de atrelar a publicação ao alvo de seus protestos, o
PT, que considera ser um partido "canalha", "totalitário" e "nêmesis da
liberdade e da democracia". Diante do incidente provocado pelos colegas,
o garoto se omitiu. Renan, seu parceiro, preferiu segurar um dos
jornalistas pelos dois braços e fez menção de bloquear as filmagens.
Martins caiu em si ao ser lembrado de que os jornalistas eram seres
humanos como ele, com famílias e problemas como os de qualquer outro.
Arrependido, montou uma segunda "escolta" com outros integrantes do MBL,
alguns lamentando o fato potencialmente negativo para a imagem do
movimento e outros genuinamente preocupados, como o jornalista do SBT do
Paraná Paulo Eduardo Martins, crítico ardoroso do PT, que liderou a
"comitiva" de proteção.
O episódio, infelizmente, não foi um aprendizado para a liderança do
grupo. Horas depois do fato surgiu na página do MBL uma postagem que
exibia um manifestante anti-petista como tolerante e pacífico
(em contraposição a um suposto petista violento), contrariando os fatos
ocorridos em frente ao Masp. É um tapa na cara, que ultrapassa a
barreira da desfaçatez e flerta com a cafajestagem. Para o próximo 12 de
abril, o Movimento Brasil Livre já marcou um novo protesto. Quem sabe
lá eles esclareçam: o Brasil que imaginam é livre para quem? E, mais
importante, livre de quem?
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