Impostometro

quarta-feira, 12 de março de 2014

Afinal: o empregador pode ou não checar os emails corporativos de seus empregados?

Afinal: o empregador pode ou não checar os emails corporativos de seus empregados? 

O monitoramento de e-mails por parte dos empregadores é prática cada vez mais comum no mundo empresarial e merece especial atenção da doutrina, sobretudo diante do várias lides em que são requeridas indenizações por danos morais decorrentes da violação à privacidade do empregado. Trata-se, mais do que uma questão meramente teórica, de uma realidade no mundo contencioso. Mas afinal, o empregador tem o direito de monitorar os e-mails de seus colaboradores?
Fundamentos da controvérsia. Com o desenvolvimento da internet e a globalização, o e-mail se tornou ferramenta indispensável ao bom andamento das empresas, que criaram e-mails corporativos que, no mundo virtual, substituíam as antigas cartas em papel timbrado. Pesquisas indicam que 2014 começa com um fluxo de cerca de 244 milhões de e-mails vinculados a empresas, com expectativa de chegar a 300 milhões ao final do ano.
Tal explosão do uso de e-mails e abandono das cartas em papel timbrado foi motivado pela facilidade e agilidade, indispensáveis ao ambiente corporativo moderno. Seguiu, também, a tendência de desmaterialização e
de atuação corporativa sustentável, princípios basilares de uma era que abandona o desenvolvimentismo puro e abraça um desenvolvimento sustentável e ecológico.
A migração do papel para o email ainda enfrenta a resistência de alguns, mais apegados ao tato e ao carimbo, mas é inegável a tendência pela virtualização, como atestam a ainda incipiente estruturação do processo eletrônico (lei 11.419/2006), a disseminação de equipamentos eletrônicos que substituem os papéis (como os e-books) e a criação de mecanismos digitais de autenticação de documentos, que substituem com idêntico valor legal as assinaturas manuais.
Paralelamente, o boom econômico popularizou os computadores pessoais, e o foco do e-mail foi migrando dos objetivos públicos estratégicos (que remontam à sua gênese, na corrida tecnológica da Guerra Fria) a uma forma de correspondência entre particulares.
A junção destas duas linhas evolutivas criou a controvérsia, já que trabalhadores passaram a ser, simultaneamente, titulares de e-mails de uso pessoal e de uso corporativo. De um lado, alocavam-se ose-mails genericamente na esfera do direito individual à privacidade e à intimidade. Divergindo, outra corrente separava os e-mails em pessoais e corporativos, um compondo o direito à privacidade e à intimidade e outro compondo o direito de propriedade do empregador, submetidos ao seu poder diretivo.
A controvérsia se firma, assim, em duas correntes: os que julgam quaisquer e-mails protegidos contra fiscalização e os que permitem a fiscalização, pelo empregador, do email corporativo, mas não do e-mail pessoal.
O que diz a leiA Carta Magna de 1988 consagra no artigo a inviolabilidade da intimidade, da vida privada e o resguardo do sigilo da correspondência como direito fundamental. Eis o argumento que levou parte dos juristas a alocar os e-mails, indistintamente, como parte da “correspondência inviolável”.
Já a corrente antagônica, atualmente majoritária, vê uma barreira separando a vida profissional da estritamente privada. Agindo o trabalhador em nome da empresa para a qual entrega sua força de trabalho, extrapolaria a esfera de sua vida privada.
Isso sugere que a inviolabilidade garantida pela Constituição limita-se à correspondência de uso pessoal, sob a qual não cabem ingerências, mesmo se acessada pelo trabalhador em computador pertencente à empresa e durante o horário de expediente. Já os e-mails corporativos, consideradosferramentas de trabalho, não se inserem na vida privada do usuário.
Além do fundamento lógico, há outros de ordem legal. O mesmo artigo 5º consagra o direito à propriedade (caput) e à inviolabilidade da imagem (inciso X). O artigo 932, III, do Código Civil, por sua vez, obriga o empregador a reparar danos causados por seus empregados no exercício do trabalho ou em razão dele.
Assim, sendo o e-mailcorporativo propriedade do empregador e considerados os riscos de violação à imagem da empresa pelo seu uso inadequado e a responsabilidade objetiva da empresa perante os atos de seus empregados, é preciso retirar os e-mailscorporativos do âmbito da vida privada.
A jurisprudência trabalhista, orientada pelo Princípio Protetivo e pela presunção de hipossuficiência do trabalhador, por certo tempo relutou em adotar a divisão entre e-mails pessoais e profissionais.
Contudo, um importante Acórdão da 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho publicado em 10/06/2005 (RR61300-23.2000.5.10.0013), com relatoria do ministro João Oreste Dalazen, reconheceu que há de se separar os e-mails pessoais (protegidos pela Constituição, em seu artigo , incisos V, X, XII e LVI) dose-mails corporativos.
O monitoramento de e-mailcorporativo é, assim, perfeitamente lícito, desde que respeitada a exigência de comunicação prévia da finalidade estritamente profissional da ferramenta.
Costuma-se, assim, sugerir às empresas que constem dos contratos de trabalho cláusula expressa em que dá ciência do caráter eminentemente profissional dos e-mails corporativos e de sua sujeição a monitoramentos de rotina.
É também aconselhável às empresas que se obstem de promover monitoramentos direcionados e injustificados, pois tal conduta, apesar de lícita, gera o risco de alegação de discriminação ou perseguição de trabalhadores, que ensejaria indenização por outro motivo, diferente da violação da privacidade. Fiscalizações genéricas e impessoais (ou, se direcionadas a um colaborador específico, motivadas por suspeita razoavelmente justificada) são mais adequadas, mormente em um ambiente jurídico que costuma generalizar a má-fé e encarar indistintamente as empresas com olhares suspeitos.

Acrescento um ponto à matéria: os servidores corporativos de emails quando são conectados a smartphones, requerem acesso total e irrestrito a todo conteúdo do celular. Sejam fotos, vídeos, contas, senhas, apps, etc... Até o número de vezes que se tenta desbloquear a tela do equipamento é relatado. Quando o equipamento é corporativo, tudo bem: é ferramenta de trabalho fornecida pela empresa e ela pode (meu entendimento) checar mesmo se o uso está sendo seguro e condizente com a proposta. Mas, quando o empregado não tem celular corporativo e precisa (ou mesmo quer) checar emails corporativos fora do ambiente da rede interna (no caso de gerentes, por exemplo) e autoriza expressamente este acesso geral da empresa a seu celular pessoal, fica muito difícil saber se a empresa acessou ou não seus dados íntimos ou pessoais. É uma questão moderna, que começa a se apontar, mas que devemos ficar atentos para que não seja uma forma de violação aos princípios constitucionais da intimidade e da privacidade.

São Paulo (11) 97965-1061 / luizricardosp@aasp.org.br
 
Fonte: http://luizricardosp.jusbrasil.com.br

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário