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sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Cine Holliúdy

"Cine Holliúdy", um sucesso inesperado

O filme, que já provou o gosto do triunfo no circuito do Nordeste, chega aos cinemas do Sudeste com grandes expectativas


Cena do filme Cine Holliúdy (Foto: Divulgação)


Década de 1970, interior do Ceará. Um nordestino arretado tenta de todas as formas salvar a cultura do cinema do esquecimento decorrente da popularização da televisão. Francisgleydisson (Edmilson Filho) é dono de um cinema mambembe que monta na traseira de seu carro nas praças das cidades por onde passa. Em uma última tentativa de realizar o sonho de exibir seus filmes trash de kung fu para uma plateia cheia, ele leva mulher (Miriam Freeland) e filho para uma cidadezinha onde crê ainda não haver televisores. Ao chegar, gasta todo o seu dinheiro na compra de um imóvel que possa comportar o tão sonhado Cine Holliúdy.
Apesar de lúdico e das cenas
cômicas, a história do filme Cine Holliúdy, que estreia nesta sexta-feira (15) nas salas do Sudeste, não é totalmente ficcional. O diretor cearense Halder Gomes viveu os últimos dias do cinema mambembe nas cidades do interior do Nordeste quando era criança. “Na época, eu nem sabia que estava presenciando o fim de uma era”, diz o diretor, que, antes de criar o longa-metragem era dono de uma academia de artes marciais.
Ao que tudo indica, os nordestinos sentem falta dessa era extinta. Cine Holliúdy estreou em agosto fora do circuito tradicional de São Paulo e Rio de Janeiro e, ainda assim, foi sucesso de público. Atingiu a marca de mais de 400 mil espectadores em três semanas de exibição, só em Fortaleza. Ficou entre os dez filmes mais vistos do Brasil, com lançamento apenas na capital, e teve uma média de público por sala maior que a do blockbuster Titanic, quando foi lançado em 1998.
A receita para o fenômeno de bilheteria está na representação do nordestino verdadeiro, de acordo com Gomes. “O filme traz um olhar realista do que é o cearense”, afirma. Para o diretor, os filmes brasileiros trazem versões estereotipadas dessas personagens. Cine Holliúdy retrata o nordestino com autenticidade, funcionando como um espelho para o público. O crítico de cinema Celso Sabadin concorda. “O filme traz o Nordeste real, feito por um nordestino real, em condições próprias do Nordeste. Daí surge a identificação”, afirma.
Entretanto, o filme ainda tem outra carta na manga. Falado em um dialeto que o diretor chama cariosamente de cearensês, Cine Holliúdy é acompanhado de legendas para facilitar a compreensão das gírias e estilo de conversar dos moradores do Estado do Ceará. “Não quis tirar essa característica natural dos atores, por isso tive a ideia de usar as legendas para facilitar para o público de fora”, afirma Gomes. Para ele, essa é uma forma do Brasil se autodescobrir. “Um país desse tamanho possui diversos dialetos, dentro de suas próprias línguas. É muito importante mostrar isso de forma verdadeira”, diz.
Se o sucesso no Nordeste foi incontestável, agora a dúvida recai na recepção do Sudeste. “Já faz muito tempo, a maioria das salas de cinema do Sudeste desenvolveram um processo de elitização, afastando o público das salas de cinema e arrastando-o para a internet e para a pirataria”, diz Sabadin. Com isso, diminuiu o número de pessoas que preferem uma produção cinematográfica mais arraigada à cultura verdadeiramente brasileira. A expectativa para repetir o fenômeno de Cine Holliúdy fica por conta dos nordestinos radicados na região, que poderão se identificar e inflar ainda mais os números do filme.
Segundo o crítico de cinema Daniel Schenker Wajnberg, o público do Sudeste pode se afeiçoar ao filme pelo tema central da comédia: a retomada da derrocada dos cinemas, particularmente os de rua. “De forma despretensiosa, o filme mostra a difícil sobrevivência do entretenimento artesanal devido à concorrência com a televisão”, diz. “Essa questão vale até mais do que o filme em si.”
Com uma produção nacional de filmes tão grande como a de 2013, foi possível descobrir ainda outras surpresas de bilheteria. Desde a chamada retomada, que aconteceu duas décadas atrás, a média de filmes nunca foi tão grande: foram 115 lançamentos. Na lista de sucessos de 2013, Cine Holliúdy aparece ao lado de Minha mãe é uma peça, com Paulo Gustavo que teve mais de 4,5 milhões de espectadores, Somos tão jovens, com 1,7 milhão de ingressos vendidos, e Faroeste Caboclo, com 1,5 milhão. Estes últimos, baseados na vida e obra de Renato Russo (1960-1996). “Acredito que o público esteja começando a separar o joio do trigo e a discernir melhor”, afirma Celso Sabadin. “Aos poucos, ele ficará mais consciente e os produtores vão perceber que não adianta fazer qualquer coisa”, diz. Mas, para isso é preciso, antes de mais nada, bons roteiros. “Essa tem sido a nossa principal deficiência.”
Por isso, mesmo com a produção crescente, ainda falta muito para que o público brasileiro vá em massa ver um filme brasileiro motivado por fatores unicamente cinematográficos. “Mas a gente chega lá: sou otimista”, diz Sabadin.
Miriam Freeland e Joel Gomes em cena do filme Cine Holliúdy (Foto: Divulgação)


Fonte: http://epoca.globo.com

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