Roseana Sarney veta lei contra escravidão
Governadora do Maranhão alega que proposta vai contra
Constituição e recebe críticas; deputado autor do projeto promete
tentar derrubar veto. Ela enfrenta, ainda, pedido de cassação do mandato
por abuso de poder político e econômico
A
governadora do Estado do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), vetou o
projeto de lei nº 169/2013, que havia sido aprovado na Assembleia
Legislativa do Estado e previa a cassação do registro de Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de empresas flagradas com
trabalho escravo. O veto foi publicado na edição de segunda-feira (5) do
Diário Oficial da Assembleia Legislativa e, na sua justificativa, a
governadora alegou que o texto é inconstitucional.
De
autoria do deputado Othelino Neto (PPS), o projeto foi inspirado na lei
paulista nº 14.946/2013, de autoria do deputado Carlos Bezerra Jr.
(PSDB), que foi regulamentada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) em
maio. Propostas semelhantes já foram apresentadas nos estados de Mato
Grosso do Sul, Tocantins e Rio de Janeiro. Além da cassação do registro
de ICMS, ambas as matérias determinam que as empresas que se
beneficiarem de mão de obra escrava serão impedidas de exercer o mesmo
ramo de atividade econômica ou abrir nova empresa por dez anos.
O
projeto de lei de Othelino Neto é o segundo com o mesmo teor a ser
proposto neste ano na Assembleia Legislativa do Maranhão. Em maio, a
Repórter Brasil noticiou que o deputado Bira do Pindaré (PT) havia
apresentado o projeto de lei nº 078/2013, que também foi inspirado na
lei paulista. A matéria, no entanto, não obteve parecer favorável da
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde teve como
relator o deputado Tatá Milhomem (PSD), que alegou “vício de
iniciativa”. No seu entendimento, esse tipo de lei não poderia partir do
Poder Legislativo. Quando um projeto de lei recebe parecer negativo da
CCJ, o deputado que o propôs pode pedir que o plenário vote por reverter
o parecer, o que permite a votação do projeto. Bira, no entanto, não
fez isso: “Para reverter precisamos de 22 votos, que é a maioria dos
deputados da Assembleia. Como faço parte da minoria que faz oposição ao
governo, nunca consegui reverter um parecer contrário ao meu”, explicou.
Os
dois projetos se diferenciam majoritariamente no primeiro artigo, que
define quais serão as empresas punidas. Enquanto a proposta de Bira
também pune as empresas que se beneficiaram de trabalho escravo em
qualquer etapa da cadeia produtiva, sendo responsabilizadas também pelo
flagrante de funcionários em empresas terceirizadas, somente as empresas
envolvidas diretamente com escravidão são alvo do projeto de Othelino
Neto.
Para Ítalo Rodrigues, procurador do
Ministério Público do Trabalho no Maranhão, “responsabilizar a empresa
por condições indignas em qualquer das etapas de produção é bem mais
condizente com as disposições internacionais acerca do trabalho”. Ele
ressalta que as empresas flagradas fazendo uso de trabalho escravo
colocam, em geral, o seu processo produtivo de uma forma “pulverizada”, o
que resulta na subcontratação de outras empresas, processo também
conhecido como “terceirização”. O deputado paulista Carlos Bezerra Jr.
considera que alteração do primeiro artigo “suprime a possibilidade de
penalizar a terceirização de fachada e tira a possibilidade de enfrentar
o problema na sua raiz”.
Questionado, Othelino
disse que a proposta de lei “atinge seu objetivo” e que “não tem a
pretensão de atacar todos os aspectos do trabalho escravo”. À Repórter
Brasil, ele afirmou que vai tentar convencer os demais deputados a
derrubar o veto de Roseana. Para isso, é necessário que ao menos 22
deputados, a maioria simples do plenário, votem pela derrubada. O
projeto de Othelino foi apresentado semanas depois do de Bira. Com
tramitação em regime de urgência – para que, segundo o deputado, “fosse
aprovada antes do recesso do Legislativo” –, ele conseguiu as
assinaturas necessárias que garantiram a reapresentação de projeto
semelhante a outro rejeitado no mesmo ano. Tendo o deputado Rubens
Júnior (PCdoB) como relator na CCJ, a proposta obteve parecer favorável e
foi aprovada pelo plenário em 8 de julho.
Apesar
das diferenças entre as propostas, Bira do Pindaré acha “positivo o
fato de que o que era nossa intenção principal tenha prosperado na
Assembleia”. Ele considera “pouco provável” que o veto de Roseana Sarney
seja derrubado, mas apoia a iniciativa de Othelino Neto de tentar
derrubá-lo.
Opção conservadora
A
justificativa de veto da governadora do Maranhão é, para o deputado
paulista Carlos Bezerra Jr., “uma opção conservadora, que vai na
contramão dos avanços da luta contra o trabalho escravo”. Já Othelino
acredita que Roseana Sarney “se demonstra insensível a um tema
importante como esse, que está acima de questões meramente partidárias”.
Para
vetar a proposta de Othelino, a governadora do Maranhão alegou que o
texto é incompatível com o artigo 43 da Constituição do Estado do
Maranhão, que garante ao Poder Executivo exclusividade para propor leis
de natureza tributária, categoria na qual, no seu entendimento, o
projeto de lei estaria incluído.
O próprio artigo
43 é alvo de questionamento do deputado Hélio Soares (PP), que
elaborou, em 2011, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) visando
alterá-lo para derrubar essa exclusividade do Executivo. A PEC 03/2011
já foi aprovada por todas as comissões da Assembleia Legislativa do
Estado e passou em primeira votação, mas ainda é necessária uma segunda
votação antes que possa ser encaminhada à governadora para sanção.
O
Supremo Tribunal Federal (STF) também vem discutindo a questão. De
acordo com o advogado Eduardo Corrêa, presidente da Comissão de Defesa
da República e da Democracia da OAB no Maranhão, “existem reiteradas
decisões no STF sobre as quais os Poderes Legislativos estaduais possuem
poder de iniciativa para legislar sobre matéria tributária”.
“Tecnicamente a Assembleia Legislativa do Maranhão pode derrubar o veto.
A questão é se eles vão ter a disposição política para isso”, disse.
| Trabalhadores resgatados em fazenda zoológico no Estado viviam em tendas improvisadas - Foto: MTE |
Trabalho escravo no Estado
Um
levantamento de 2007 da Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho
Escravo (Coetrae) do Maranhão mostrou que o Estado era então o principal
fornecedor de mão de obra escrava. Na lista suja, o Maranhão aparece ao
lado do Tocantins como a quinta unidade da federação com maior número
de empregadores flagrados com escravos. Dos 498 nomes, 34 são de
flagrantes no Estado. Além disso, o Maranhão tem a segundo pior
colocação no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de acordo
com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013.
Pedido de cassação
O
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pediu a cassação da
governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), e de seu vice,
Washington Luiz Oliveira (PT), em processo que corre no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE). Eles são acusados de abuso de poder político e
econômico no pleito de 2010, quando Roseana tentava a reeleição.
O
processo foi movido pelo ex-governador José Reinaldo Tavares (PSB).
Segundo ele, houve intensificação de convênios com prefeituras com
intenção de obter apoio de prefeitos e de lideranças locais. As provas
indicam que nos três dias anteriores à convenção partidária, 670
convênios foram assinados para a liberação de mais de R$ 165 milhões.
Outra
acusação aponta que o governo de Roseana investiu na construção de
moradias do Programa Viva Casa no período que antecedeu as eleições, com
gastos de R$ 70 milhões não previstos em orçamento.
(com informações da Agência Brasil)
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/17729
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